07:42 02-12-2025

UNK: o colisor soviético abandonado sob Protvino, na Rússia

Conheça o UNK, colisor subterrâneo de 21 km em Protvino: a história do acelerador U‑70, da ambição científica da URSS e do túnel abandonado na Rússia.

A cerca de 130 quilômetros da capital fica um sítio em escala de linha circular de metrô. Trata-se do complexo subterrâneo UNK — um anel de 21 quilômetros, com cerca de cinco metros de diâmetro. Concebido como um salto rumo ao futuro da ciência soviética, acabou se tornando um dos empreendimentos abandonados mais enigmáticos do país.

Uma cidade que cresceu sobre um antigo leito marinho

O local escolhido fica na divisa das regiões de Moscou e Kaluga. Nos anos 1960, ergueu-se ali a cidade científica de Protvino. A área assenta em sedimentos de um mar extinto — solos estáveis contra vibrações — o que a tornava ideal para grandes estruturas que precisavam de proteção contra riscos sísmicos.

Protvino foi planejada como um polo de pesquisa com um tecido urbano confortável. As moradias seguiam projetos individuais, e quarteirões inteiros preservavam faixas de floresta. A cidade tinha escolas, lojas e uma Casa dos Cientistas que recebia artistas de passagem. Para os físicos, as condições eram, pelos padrões da época, claramente privilegiadas.

Como nasceu o primeiro acelerador

A construção começou em 1961, com financiamento sem precedentes e sob a liderança de especialistas militares com experiência nesse tipo de instalação. Assim surgiu o acelerador U‑70 — hoje o mais potente da Rússia. A instalação é um grande anel de cerca de um quilômetro e meio, abrigado dentro de um ímã colossal de 20.000 toneladas. Ali, partículas são aceleradas a quase a velocidade da luz para estudos de colisão; pesquisadores também testam os efeitos da radiação em eletrônicos e desenvolvem técnicas de irradiação de tumores com alta precisão.

Por que era preciso um colisor

Costuma-se comparar a lógica do acelerador a desmontar um brinquedo: para entender como algo é feito, às vezes é preciso quebrá-lo. Em física, partículas colidem a energias imensas, e seus “fragmentos” expõem processos no coração da matéria. Pesquisar nesse patamar, porém, exige tecnologia de ponta — e orçamentos à altura. Daí o passo seguinte, o complexo acelerador‑armazenador UNK, ter se tornado o maior projeto de construção do final da era soviética.

O último anel da União

Em 1983, começaram as obras de um novo túnel subterrâneo. O plano previa dois anéis: o U‑70 existente e um UNK gigante, de 20 quilômetros. O avanço foi lento até uma decisão, em 1987, de acelerar o cronograma. Um ano depois, a União Soviética comprou tuneladoras modernas, e a escavação disparou. Em 1989, a maior parte dos túneis já estava escavada.

No início dos anos 1990, o projeto esbarrou numa crise financeira. Tentou-se colocar a obra em conservação, mas até isso se mostrou caro demais. Sem manutenção adequada, os próprios túneis podiam virar um risco para a região.

O anel foi fechado — tarde demais

Em 1994, as equipes conectaram os últimos segmentos, concluindo, na prática, o túnel de 21 quilômetros. Mas já não havia recursos nem para salários. O golpe de misericórdia veio com a decisão da Rússia de participar da construção do Grande Colisor de Hádrons na Europa. A partir daí, as perspectivas do UNK ficaram incertas, e terminar a obra passou a ser visto como economicamente sem sentido.

O que resta hoje

Parte da infraestrutura do UNK está abandonada; outra parte, sob vigilância. Anualmente, há verba para bombear a água e manter o local seguro. Surgem propostas que vão de reativá-lo como centro de pesquisa a transformá-lo em rota turística, mas todas batem no mesmo muro: custo.

Ainda assim, o U‑70 segue em operação. Continua sendo uma instalação de pesquisa de peso, onde se realizam experimentos de calibre global.