07:28 01-12-2025

Vale da Morte da Iacútia: caldeirões, mito e ciência

Explore o enigma do Vale da Morte da Iacútia: relatos de caldeirões, doenças misteriosas, lagos circulares e explicações científicas com gás e permafrost.

O Vale da Morte da Iacútia continua sendo um dos enigmas mais debatidos da Sibéria. Ao contrário do homônimo americano, aqui não há calor escaldante nem deserto. Em seu lugar, estendem-se a taiga cerrada, o curso do Vilyuy e, de tempos em tempos, um acampamento de caçadores. Mesmo assim, esse trecho isolado instiga perguntas há décadas: de onde surgiram os misteriosos “caldeirões” e por que a área ganhou um nome tão sombrio?

Onde um “caldeirão” fica com árvores crescendo por dentro

Relatos orais de caçadores alimentaram lendas que, com o tempo, foram ganhando detalhes. A maioria das histórias converge para um ponto: nas cabeceiras do Vilyuy haveria enormes bacias metálicas, semienterradas no solo. Moradores dizem que os “caldeirões” seriam grandes o suficiente para entrar e até servir de abrigo contra o frio — por dentro, supostamente, a temperatura não cairia abaixo de zero.

Pesquisadores encontraram as primeiras menções a esses objetos em documentos do século XIX. O naturalista russo Richard Maak citou um “caldeirão gigante” junto ao afluente Algiy timirnit. Ninguém mediu o tamanho: só a borda estava visível, mas caçadores sustentavam que árvores cresciam lá dentro. Rigorosamente, não há confirmação — Maak não foi até o local e baseou-se em relatos. Ainda assim, foram essas falas que se tornaram a espinha dorsal da lenda.

Doença, medo e as primeiras hipóteses

Pela tradição, caçadores que desciam a um dos caldeirões passavam mal. Quem entrava uma vez sentia indisposição; quem pernoitava ali várias vezes acabava morrendo de doenças sem explicação. Assim teria pegado o nome — Елюю Чёркёчюёк, que se traduz como “vale da morte”. A impressão que fica é de que o temor se consolidou a partir de episódios repetidos e difíceis de interpretar.

A carta de Mikhail Koretsky: o relato mais detalhado

O maior alvoroço veio com uma carta de Mikhail Koretsky, publicada no jornal Trud em 1996. Ele dizia ter visto sete caldeirões nas décadas de 1930–1940 e destacou alguns elementos curiosos:

Koretsky e seus companheiros chegaram a entrar nas estruturas; depois, um deles perdeu todo o cabelo. O autor relatou feridas no couro cabeludo. Ele também encontrou uma pedra preta de forma perfeita que cortava vidro com facilidade. Chama atenção como a descrição enfatiza texturas e efeitos no corpo — marcas que, em histórias assim, costumam pesar mais do que medidas precisas.

Dois lagos arredondados e montículos estranhos

Após a carta, a redação recebeu muitos relatos parecidos. O mapa dos supostos artefatos se expandiu — e a confusão, também. Já no século XXI, entusiastas organizaram expedições por conta própria. Não encontraram caldeirões, mas dois indícios chamaram a atenção de forma recorrente:

Perto dos lagos, a agulha da bússola se comportava de modo errático, o que só alimentou a intriga.

Explicações científicas: gás, permafrost e geologia

Os especialistas preferem manter os pés no chão. O Comitê Estatal de Geologia da Iacútia observa que a região é rica em exsudações de gás. A inalação de metano pode provocar alucinações e queda repentina do bem-estar. Quanto aos lagos circulares e aos montículos, a maioria dos pesquisadores os vê como manifestações de processos criogênicos:

Esses lagos costumam delinear contornos quase perfeitamente circulares. Diante dessas explicações, o cenário ganha uma lógica que dispensa soluções mirabolantes.

E os “caldeirões”?

Historiadores sugerem que a imagem de uma tigela de cobre pode remontar a achados antigos de vasos de bronze. A Sibéria abrigou tribos ligadas aos citas, que possuíam grandes caldeirões citados por Heródoto. Talvez caçadores de antigamente tenham de fato avistado uma peça desse tipo — e um único encontro acabou crescendo até virar lenda.

Um lugar onde os mitos sobrevivem às pessoas

Histórias sobre “criaturas negras de um olho só”, “homens de ferro”, metal misterioso e capim estranho seguem circulando em conversas e artigos. Só que, à medida que a taiga é estudada, respostas prosaicas vão ocupando o espaço onde antes reinava o misticismo. Mesmo assim, o Vale da Morte permanece como um ponto em que o folclore às vezes soa mais convincente do que as evidências — talvez seja por isso que tanta gente retorna, de tempos em tempos, a essa história.